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Curiosidades

Uma breve história do Irã

Texto Rafael Battaglia | Design Brenna Oriá | Edição Bruno Vaiano

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Ano-Novo do Irã acontece no final de março. É o Nowruz, que significa “novo dia” em persa – o idioma oficial do país – e coincide com a chegada da primavera no Hemisfério Norte.

O feriado, também celebrado por outros povos da Ásia Central, teria sido criado por um antigo rei chamado Jamshid na cidade de Persépolis. Ele queria um evento marcante para o fim do inverno, época em que os seus súditos costumavam brigar devido ao frio e à escassez de recursos.

No Norwuz, as famílias montam uma mesa com sete itens. Cada um carrega um significado ou pedido para o ano que vai nascer: o alho representa saúde, a grama representa renascimento e por aí vai. As pessoas não pulam ondas, mas sim fogueiras, de mãos dadas.

A história de Jamshid aparece no Shahnameh, o “Épico dos Reis”, um calhamaço de 50 mil linhas escrito pelo poeta Ferdusi e publicado em 1010 d.C. É um dos livros mais importantes da cultura iraniana e abrange milhares de anos da formação do país.

Só tem um detalhe: é bem provável que Jamshid jamais tenha existido. Ao longo do Shahnameh, Ferdusi mistura fato e mito. Foi somente no século 19 que escavações arqueológicas começaram a decifrar a verdadeira história do Irã – que, por muito tempo, foi chamado de Pérsia (já vamos entender por quê).

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A civilização iraniana é uma das mais longevas da humanidade, e traçar suas raízes ajuda a compreender os conflitos envolvendo o país nas últimas décadas. Vamos lá.

Presente de grego

Junto com seus vizinhos da Suméria, os elamitas foram um dos primeiros povos a formar grandes centros urbanos, 5 mil anos atrás. Eles viveram no sudoeste do atual Irã – uma região que os assírios, que viviam no norte da Mesopotâmia (atual Iraque), chamavam de “Persis”.

Os elamitas prosperaram e fundaram importantes cidades, como Ansã e Susa. Mas eles não eram os únicos no pedaço. A região é um extenso planalto na encruzilhada entre a Ásia Central, o Oriente Médio e o Cáucaso. Com o tempo, vários povos acabaram se fixando por lá.

Dois deles são importantes para essa história: os medos, que formaram um reino ao norte do planalto, e os próprios persas, nômades que circulavam, é claro, em Persis.

<span class=”hidden”>–</span>Arte/Superinteressante
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Ambos têm origem indo-ariana – nome de um grupo de populações da Ásia Central e da atual Índia que nada tem a ver com nazistas (Hitler adotou o termo erroneamente como parte de seus devaneios raciais pseudocientíficos). “Ariano” vem de arya, que no idioma sânscrito transmitia ideias como “nobreza”, “honra” e “liberdade”. É de arya que deriva o nome “Irã”.

Por gerações, os medos dominaram os persas. Mas isso mudou a partir do século 7 a.C., quando o rei Aquêmenes teria unido as tribos nômades e dado início a um dos maiores impérios da história: o Aquemênida.

Nunca foi comprovado que Aquêmenes existiu. Mas a dinastia que levava seu nome de fato foi capaz de juntar os persas e expandir os seus domínios. Eles conquistaram os medos e, depois, os elamitas. A partir daí, continuaram rumo a oeste para dominar a Babilônia.

A grande expansão aquemênida começou no reinado de Ciro II, em 559 a.C. Ciro ganhou a alcunha de “o Grande” pelas suas habilidades militares e pelo estilo de governo: ao contrário da maioria dos imperadores da Antiguidade, ele não impôs sua religião e costumes às sociedades conquistadas. As regiões do império (chamadas de satrápias) mantiveram certa autonomia política e cultural.

Ciro construiu estradas e sistemas de abastecimento de água. Em troca, pedia lealdade das satrápias e o envio de homens para o exército. Também criou uma nova cidade em Persis, Pasárgada, para ser a capital do império. Seus territórios se estendiam da atual Turquia até o atual Afeganistão.

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Ciro morreu em 530 a.C. Quem ocupou o trono foi o seu filho mais velho, Cambises, que não tinha o jeitão conciliador do pai. Pelo contrário: era um rei violento e impopular. Morreu após uma campanha militar no Egito e não deixou herdeiros.

O império acabou nas mãos de um primo de Cambises, Dario, que precisou lidar com diversas revoltas assim que assumiu. Mas deu certo: ele acalmou os ânimos do império, diminuiu a corrupção do governo e fez importantes mudanças, como padronizar medidas e criar um sistema de correio.

No Egito, Dario reconstruiu uma ligação entre o Rio Nilo e o Mar Vermelho – um precursor do Canal de Suez. Em Persis, ergueu outra cidade: Persépolis. Repleta de grandes construções, ela serviu como capital e polo cultural dos aquemênidas. Foi o auge do império, que na época abrigou 40% da população mundial.

No século 5 a.C, a expansão de Dario chegou até a Grécia, cujos povos se referiam aos aquemênidas como persas – uma generalização do nome da região que concentrava o poder do império, Persis (ou “Pérsia”). O rei começou invadindo a Trácia, na atual Bulgária, e a vizinha Macedônia, que aceitou virar um estado vassalo de forma pacífica.

A chegada dos persas incomodou grandes cidades-estado como Atenas e Esparta, que temiam perder a sua influência na região. Elas incitaram revoltas que obrigaram Dario a agir.

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O objetivo era uma invasão rápida, que cessasse as rebeliões. Não foi o que aconteceu. Em 490 a.C., os gregos venceram uma importante batalha na cidade de Maratona, que forçou o recuo persa. Dario, então, passou os anos seguintes preparando soldados e navios para uma segunda invasão, que não chegou a liderar: ele adoeceu e morreu aos 64 anos de idade.

Mapa, em fundo marrom, com informações do relevo do Irã.
<span class=”hidden”>–</span>Arte/Superinteressante

Xerxes, seu filho, encarregou-se da guerra. É a história que você viu no filme 300. De um lado, o exército persa, formado por centenas de milhares de soldados, vindos dos quatro cantos do império. Do outro, a aliança grega, em menor número.

Em 480 a.C., os persas incendiaram Atenas. Mas isso não abalou os gregos. Jogando em casa, eles forçaram confrontos em regiões estreitas, de difícil locomoção, para afunilar o exército persa e igualar o número de soldados no front. Deu certo. Episódios como a Batalha das Termópilas, em que o rei espartano Leônidas atrasou o avanço persa, e a batalha naval de Salamina, vencida pela esquadra grega, obrigaram Xerxes a recuar.

A Pérsia passou as décadas seguintes em meio a revoltas e crises financeiras – consequências da derrota para os gregos. Enfraquecido, o império sucumbiu ao avanço do macedônio Alexandre, o Grande, em 332 a.C. Xandão admirava a cultura persa, mas isso não o impediu de saquear e destruir Persépolis.

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Quando Alexandre morreu, dinastias persas dividiram o império. Da confusão emergiram os partas, persas do norte que reunificaram o reino e governaram por quase 500 anos – boa parte desse tempo, guerreando contra os romanos.

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Em 224 d.C., uma província vassala dos partas tomou o poder: os sassânidas. Eles nomearam o reino como “Erânshahr” (“Domínio dos Arianos”) e fizeram uma série de reformas que ajeitaram a economia do império. Foram anos de bonança para os iranianos nas artes, nas ciências e na arquitetura. A Rota da Seda, eixo comercial entre o Oriente e o Ocidente, passava bem no meio do império, o que fez com que a cultura persa se espalhasse mundo afora.

Os sassânidas instituíram como religião oficial o zoroastrismo, praticado desde o tempo dos aquemênidas. O nome vem do profeta Zaratustra, cuja data de nascimento é incerta (alguns defendem que ele viveu há 3,5 mil anos; outros, que é contemporâneo de Ciro). Ele é o criador da primeira fé monoteísta de que se tem registro, cujas bases inspiraram outras religiões, como o cristianismo.

No zoroastrismo, só existe um único deus, Ahura Mazda. A doutrina introduziu os conceitos de céu e inferno (“paraíso” é uma palavra de origem persa), de anjos e demônios e do dia do julgamento final. Notou as semelhanças? Hoje, há 25 mil praticantes da religião no Irã.

A prosperidade dos sassânidas, claro, atraiu olhares invejosos – eles viviam em rixa com bizantinos, turcos e hunos. Temendo invasões, decidiram construir uma muralha de 200 km de extensão ao norte do império.

O paredão ia das montanhas até o Mar Cáspio, passando por diferentes tipos de relevo. Ao longo dele, 30 mil soldados protegiam a fronteira, divididos em 40 fortes. A estrutura ficou conhecida como a Grande Muralha de Gorgan, nome de uma cidade da região, e é mil anos mais antiga que a Muralha da China. Na época, era a maior construção defensiva já feita. Pena que a maior ameaça aos sassânidas não veio do norte, mas do oeste.

A noite da Arábia

Os islamismo nasceu em 610 d.C. quando Maomé, um rico comerciante da cidade de Meca, passou a pregar uma religião centrada em um único deus, conhecido simplesmente como “O Deus” (Allah). Na época, os árabes eram politeístas. Perseguido, Maomé fugiu em 622 para outra cidade, Medina, onde foi bem recebido e virou xeique.

O governo de Maomé prosperou e o profeta ganhou cada vez mais adeptos. Em 629, um exército islâmico com 10 mil homens tomou Meca e o controle da Arábia. Maomé morreu em 632. Seu amigo, Abu Bakr, tornou-se o primeiro califa (“sucessor”, em árabe) e continuou a expansão do Islã. No caminho, estavam os persas.

Os árabes dominaram a Pérsia em 635 e disseminaram o islamismo (hoje, 96% do Irã segue a religião). Mas essa não foi uma via de mão única. Dos iranianos, os árabes adotaram a moeda (o dirham), o modelo de governo dos vizires (que eram ministros e conselheiros reais) e até alguns aspectos da arquitetura e da moda.

(Uma curiosidade extra: o alfabeto árabe tem 28 letras. Os iranianos colocaram mais quatro – e isso deu origem ao persa moderno.)

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Não foi uma harmonia perfeita, porém. Mesmo convertidos, muitos persas sofriam preconceito. Isso fez com que alguns grupos não árabes se unissem em rebeliões. Em 946, a dinastia Buída derrotou o califado da dinastia Abássida, que estava no comando, e devolveu o poder aos iranianos.

Os buídas tinham saudade do que nunca viveram. Eles se empenharam em resgatar a cultura dos grandes impérios persas do passado: os aquemênidas e os sassânidas. Foram os buídas que pagaram o poeta Ferdusi para escrever o Shahnameh, que narra a saga iraniana até a chegada dos árabes. Ele levou mais de 30 anos para coletar todas as histórias, que até hoje são contadas no Irã.

Nos anos seguintes, novas invasões. Os primeiros foram os seljúcidas (que, mais tarde, formariam o Império Turco-Otomano). Depois, no século 13, foi a vez do mongol Gengis Khan, que matou milhões e deixou a Pérsia em ruínas, fragmentada em diversos Estados.

A recuperação só veio no final do século 15, com o xá (rei) Ismail. Ele era islâmico e oriundo dos safávidas, um dos grupos religiosos que ofereceram apoio aos iranianos no pós-Gengis Khan. Com apenas 14 anos, Ismail, que se dizia descendente de Maomé, conseguiu seguidores suficientes para conquistar o Azerbaijão e, com o tempo, toda a Pérsia. O seu maior legado foi transformar o império em uma teocracia xiita.

No islamismo, há duas grandes vertentes: os sunitas e os xiitas. Grosso modo, a raiz da divergência é que os sunitas defendem que Abu Bakr, o amigo de Maomé, tinha de fato o direito de sucedê-lo. Já os xiitas acreditam que o herdeiro deveria ter sido um parente do profeta, Ali, que também esteve presente na gênese da religião.
Hoje, 90% dos muçulmanos do mundo são sunitas. A exceção é o Irã, onde 85% do povo é xiita – consequência direta da imposição, séculos antes, de Ismail.

Mapa, em fundo azul, com informações das etnias do Irã.
<span class=”hidden”>–</span>Arte/Superinteressante

Tempos modernos

A dinastia safávida ruiu no final do século 18, após governos ruins e batalhas contra os otomanos (de maioria sunita). No lugar dela veio a dinastia Zand e, depois, a Qajar, que transferiu a capital do império para Teerã.

Os anos sob o comando dos qajares foram difíceis. “Uma sucessão de reis que acabaram por afundar o Irã economicamente, colocando o país à mercê de potências estrangeiras”, escreve o jornalista Samy Adghirni no livro Os Iranianos. Entre o século 19 e o início do século 20, o Irã perdeu territórios a leste para o Império Russo. Na outra ponta, os britânicos se instalaram no Golfo Pérsico para explorar petróleo (a British Petroleum, gigante do ramo, nasceu com o nome Anglo-Persian Oil Company).

Insatisfeita com a dinastia Qajar, a população iniciou uma revolta que culminou na primeira Constituição iraniana, em 1906. Mas ela durou pouco: em 1921, com apoio dos britânicos, o regime constitucional caiu. O poder foi para um militar, Reza Khan, que se tornou primeiro-ministro e, depois, xá.

Reza mudou de sobrenome para “Pahlavi”, nome do idioma falado na época dos aquemênidas. A ideia era reforçar seu compromisso com a cultura iraniana. Pura balela, já que o objetivo do seu governo era ocidentalizar o país.

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Algumas mudanças foram positivas. Surgiram escolas laicas e as mulheres ganharam mais direitos. Em 1935, Pahlavi mudou o nome do país de “Pérsia” para “Irã” (afinal, nem todos os iranianos têm ascendência persa). Esses avanços, contudo, aconteceram às custas de um governo autoritário, que perseguiu e matou líderes religiosos.

O filho de Pahlavi, Mohammad Reza, assumiu em 1941. Mas sua influência diminuiu após a eleição do primeiro-ministro Mohammad Mossadegh, que conseguiu nacionalizar a indústria petroleira – o que, claro, enfureceu os britânicos.

Com o apoio dos EUA, o Reino Unido armou um golpe para depor Mossadegh (documentos que comprovam o envolvimento vieram à tona em 2013). Agentes dos dois países foram ao Irã fomentar revoltas e propagandas mentirosas. Em 1953, um novo primeiro-ministro assumiu, Reza ganhou mais poder e se manteve aliado ao Ocidente.

Reza fez uma série de obras públicas e reformas no sistema educacional. Tudo isso, porém, veio acompanhado de escândalos de corrupção, gastos excessivos e mais repressão religiosa. Com a popularidade em baixa, a monarquia caiu em 1979, quando milhões de pessoas foram às ruas no que ficou conhecido como Revolução Islâmica. Quem assumiu o poder foi Ruhollah Khomeini, um aiatolá (líder xiita) e forte crítico no governo vigente.

No seu primeiro ano de governo, Khomeini teve que lidar com um ataque do Iraque. O país, na época comandado por Saddam Hussein, decidiu aproveitar a instabilidade no Irã para tentar reaver áreas no sul da fronteira entre as duas nações – uma região crucial para o comércio de petróleo do Oriente Médio.

O Irã estava enfraquecido. Até a Revolução, os EUA treinavam e financiavam parte do exército do país, mas a mamata acabou. Khomeini também teve de lidar com facções políticas internas que desejavam tomar o governo. Mas a guerra, de certa forma, uniu a população e fortaleceu o poder do aiatolá. Além disso, os iranianos receberam apoio do povo curdo – que vivia no Iraque e desejava independência.

O Iraque, porém, tinha ao seu lado a Arábia Saudita e o Kuwait (governos sunitas que temiam que a revolução xiita se espalhasse pelo continente), além dos EUA e até mesmo a União Soviética.

A guerra se arrastou por anos. Soldados lutaram em trincheiras, navios petroleiros viraram alvo e as capitais Teerã e Bagdá foram atingidas por mísseis. O momento mais crítico do conflito foi quando Hussein autorizou o uso de armas químicas, proibidas pelas leis internacionais. Elas serviram sobretudo para que Saddam acabasse com a resistência curda. Estima-se que de 50 mil a 100 mil curdos morreram – um genocídio.

Infográfico, em fundo marrom, com um mapa da Guerra Irã-Iraque e informações atuais do Irã.
<span class=”hidden”>–</span>Arte/Superinteressante

O cessar-fogo veio em 1988, após meio milhão de mortes. As consequências dessa guerra ressoam até hoje. Com poucos aliados na região, o Irã (passou a financiar grupos extremistas como o Hamas e o Hezbollah. E investiu pesado em armamento – o suposto programa de armas nucleares do país foi a justificativa para os recentes ataques de Israel, com apoio dos EUA.

Precisaríamos de uma revista inteira para falar sobre os atuais conflitos externos do Irã. E outra para os internos: desde 2022, uma onda de protestos tomou conta das ruas do país. Os manifestantes pedem por direitos às mulheres, que regrediram à Idade da Pedra desde a Revolução de 1979 (elas têm rígidas regras de vestimenta, e precisam da autorização de um homem para tirar o passaporte). Depois de milhares de anos de invasões e trocas de poder, o povo iraniano ainda precisa provar diariamente a sua resiliência.

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Sou Augusto de Paula Júlio, idealizador do Tenis Portal e do Curiosidades Online, tenista nas horas vagas, escritor amador e empreendedor digital. Mais informações em: https://www.augustojulio.com.