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Curiosidades

Pequeno por fora, gigante por dentro: Nobel de Química premia cientistas por trás dos cômodos microscópicos

O Prêmio Nobel de Química de 2025 foi concedido nesta quarta-feira (8) a Susumu Kitagawa, 74 anos, professor da Universidade de Kyoto (Japão); Richard Robson, 87, da Universidade de Melbourne (Austrália); e Omar M. Yaghi, 60, da Universidade da Califórnia em Berkeley (EUA). Eles irão dividir igualmente a quantia de 11 milhões de coroas suecas (cerca de R$ 6,2 milhões).

O trio é responsável pelo desenvolvimento das metal-organic frameworks, ou MOFs – estruturas metal-orgânicas ultraporosas que funcionam como minúsculas “esponjas atômicas”, capazes de aprisionar e organizar moléculas em escala nanométrica.

O Comitê Nobel comparou o feito a uma cena de Harry Potter: as MOFs seriam como a bolsa de Hermione Granger, que parece pequena por fora, mas guarda um espaço imenso dentro. Por trás dessa analogia divertida, há uma das descobertas mais revolucionárias da química contemporânea: a criação de sólidos com espaços internos controláveis, que podem ser usados para reter gases tóxicos, purificar água, armazenar energia e até extrair água do ar do deserto.

“As MOFs são materiais extremamente versáteis, com grande diversidade estrutural e sintética, e que possuem aplicações capazes de impactar diretamente a vida das pessoas. Por isso, ocupam hoje um papel de destaque em setores estratégicos, tanto no Brasil quanto no cenário global”, afirma Pedro Andrade, professor do Departamento de Física da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), à Super.

Até os anos 1980, os químicos já sabiam montar moléculas complexas, mas criar materiais tridimensionais com poros e canais internos (uma espécie de “cristal com cômodos”) era quase impossível. A química sólida, ou “química do estado sólido”, como descreveu o laureado Roald Hoffmann, era “um deserto sintético”.

Foi nesse contexto que o britânico Richard Robson começou a imaginar se seria possível desenhar sólidos a partir de blocos que se encaixassem como peças de Lego. Em 1989, Robson criou a primeira estrutura do tipo: um cristal feito de cobre e moléculas orgânicas que formava uma rede tridimensional cheia de cavidades microscópicas. 

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Essas “salas invisíveis” podiam ser preenchidas com pequenas moléculas de solvente – como se, em escala atômica, ele tivesse construído um diamante oco. Isso mostrou que era possível criar um sólido previsível, organizado e poroso.

Poucos anos depois, o japonês Susumu Kitagawa levou o conceito adiante. Ele demonstrou que esses materiais podiam ser estáveis e reutilizáveis, uma vez que absorviam gases como metano e oxigênio e depois os liberavam, sem perder a forma.

Kitagawa percebeu que, dependendo do desenho da estrutura, era possível “abrir” e “fechar” esses espaços internos, como portas que se movem conforme a pressão ou a temperatura. Chamou esses materiais de “cristais porosos flexíveis” e, em 1998, propôs uma classificação das “gerações” de MOFs: a primeira instável, a segunda estável e a terceira dinâmica, capaz de mudar de forma em resposta ao ambiente – um avanço decisivo para consolidar o campo.

Enquanto isso, o jordaniano Omar Yaghi, que cresceu em uma família pobre em Amã e se mudou aos 15 anos para os Estados Unidos, estava fascinado pela ideia de construir sólidos “programáveis”. Em 1999, ele criou a MOF-5, feito de zinco e moléculas orgânicas, considerado o modelo mais icônico do campo.

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Era um material resistente ao calor, com poros permanentes e altamente organizados, que não se deformava mesmo depois de todos os solventes evaporarem. A MOF-5 inaugurou o conceito de “química reticular” – o design racional de sólidos a partir de blocos moleculares modulares, como se fossem vigas e pilares em uma construção atômica.

“Uma analogia simples é pensar em um prédio sem paredes nem tetos: as vigas e colunas corresponderiam aos compostos orgânicos (chamados de ligantes), enquanto os metais atuariam como os ‘nós’ da estrutura, localizados nas junções dessas vigas e colunas. O resultado é uma rede altamente organizada, que se mantém ‘de pé’ mesmo contendo inúmeros espaços vazios – como uma pequena esponja com inúmeros poros, capazes de absorver compostos variados, como poluentes, gases, água e fármacos”, explica Andrade. 

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Desde então, a área se expandiu vertiginosamente. Mais de 100 mil tipos de MOFs já foram criados, cada um com propriedades específicas. Alguns conseguem armazenar gases em volumes cem vezes menores que tanques convencionais; outros funcionam como filtros seletivos, deixando passar apenas moléculas de certo tamanho. A estrutura pode ser ajustada trocando-se os metais (como zinco, cobre, alumínio) ou as moléculas orgânicas que os conectam, o que permite “moldar” o material conforme a aplicação desejada.

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Essa capacidade extraordinária tem aplicações que vão muito além do laboratório. “As MOFs ajudam a armazenar e separar gases, purificam a água removendo poluentes, catalisam reações químicas e podem gerar energia em baterias e células solares. Também funcionam como sensores ambientais, materiais eletrônicos e até em aplicações médicas – como na liberação controlada de medicamentos, no estímulo ao crescimento celular e no tratamento de doenças como o câncer”, destaca Andrade.

Solução sustentável

Os MOFs vêm sendo estudados para capturar dióxido de carbono (CO₂) de usinas e fábricas, ajudando a conter o aquecimento global, por exemplo. Para Severino Alves Júnior, professor do Departamento de Química Fundamental da UFPE e membro titular da Academia Brasileira de Ciências, é uma “solução promissora para mitigar as emissões de gases de efeito estufa, especialmente em indústrias onde a emissão de CO₂ é significativa, como usinas térmicas e indústrias de cimento”, disse à Super.

Aline Ribeiro Passos, pesquisadora líder do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron do CNPEM, concorda: “A grande vantagem das MOFs em relação a outras tecnologias é sua capacidade excepcional de capturar e armazenar CO₂. É preciso uma quantidade muito menor de material comparado aos materiais convencionais. Como a estrutura e o tamanho dos poros podem ser facilmente controlados durante a síntese, é possível produzir materiais otimizados para remover um poluente específico, por exemplo, tornando o processo mais eficiente”, disse à Super.

Essas estruturas também podem armazenar hidrogênio e metano como combustíveis limpos; remover poluentes persistentes da água, como os PFAS, conhecidos como “químicos eternos”; e até coletar água do ar seco – tecnologia já testada por Yaghi no deserto do Arizona. Nesta última experiência, o material absorvia vapor de água durante a noite e, quando o Sol nascia, o calor fazia com que liberasse gotas de água líquida – uma solução engenhosa para regiões áridas. 

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O impacto desses materiais é tão grande que pesquisadores e empresas passaram a chamá-los de “materiais do século 21”. Além da capacidade de absorção, eles são recicláveis, estáveis e escaláveis, podendo ser produzidos em larga escala e adaptados a diferentes fins.

“Este prêmio reforça a relevância do tema, que há anos vem se mostrando cada vez mais importante para a ciência. Trata-se de um reconhecimento justo e significativo aos pesquisadores que, de forma pioneira, evidenciaram o valor e a importância científica desses compostos”, afirma Andrade.

Pesquisas brasileiras

Atualmente, o Brasil ainda tem participação modesta na área: em 2025, apenas 0,6% dos artigos sobre o tema vieram de pesquisadores brasileiros, segundo Andrade. “Trata-se de um campo relativamente recente e que exige uma forte abordagem multidisciplinar – envolvendo químicos para as sínteses, físicos para as caracterizações e engenheiros, médicos, biólogos e farmacêuticos para a avaliação de aplicações potenciais. No entanto, como o sistema acadêmico brasileiro ainda tende a segmentar os profissionais em departamentos específicos, a interação entre essas áreas é limitada, o que dificulta o avanço da pesquisa”, explica.

O professor da UFMG destacou ainda que, apesar dos desafios, seu grupo de pesquisa organizou, em setembro, o Primeiro Encontro Brasileiro de MOFs (I-EBMOF), reunindo pesquisadores antes dispersos para discutir avanços e firmar colaborações. Segundo ele, o evento já gerou resultados concretos – como parcerias entre laboratórios (UFMG, UFJF, UFPE, UFPB e USP), mobilidade estudantil e o desenvolvimento de novos materiais, como a UFMG-1 e a UFMG-2.

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Com o reconhecimento do prêmio Nobel, espera-se que o interesse e o investimento em pesquisas sobre o campo sejam impulsionados no Brasil. “Quando uma área ganha esse tipo de destaque internacional, naturalmente atrai mais atenção de universidades, agências de fomento e até da indústria. Isso ajuda a mostrar que o tema é promissor e que vale a pena investir em infraestrutura e na formação de novos pesquisadores”, conclui Andrade.

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augustopjulio

Sou Augusto de Paula Júlio, idealizador do Tenis Portal, Tech Next Portal e do Curiosidades Online, tenista nas horas vagas, escritor amador e empreendedor digital. Mais informações em: https://www.augustojulio.com.