Metade do seu corpo não é humano
O nosso corpo não é tão nosso quanto você imagina. É intuitivo imaginar que o corpo humano é uma fortaleza composta quase inteiramente por células humanas. Na verdade, não é bem assim.
Estudos revelam que apenas 43% das células que carregamos são, de fato, humanas. O restante é formado por trilhões de bactérias, fungos, vírus e outros microrganismos que habitam nossas entranhas, pele e até o ar que exalamos. Enquanto você lê este texto, milhares de bactérias estão presentes nos seus cílios, nariz e boca. Elas fazem parte do microbioma da sua pele.
Segundo o microbiologista Rob Knight, da Universidade da Califórnia em San Diego, “somos mais micróbios do que humanos”, em declaração para a BBC.
Antigamente, acreditava-se que essa proporção era ainda maior. Durante décadas, a visão predominante era que as bactérias e outros microrganismos que habitam o corpo humano superavam em dez vezes o número de nossas próprias células – uma proporção de 10 para 1.
Essa estimativa, proposta em 1972 pelo microbiologista Thomas Luckey, foi amplamente citada e acabou cristalizando-se como verdade, apesar de ter sido baseada em cálculos simplificados e dados limitados. Somente recentemente, com o avanço de técnicas como o sequenciamento genético e a ressonância magnética, cientistas revisaram esses números. Estudos conduzidos por pesquisadores do Instituto Weizmann, em Israel, e do Hospital for Sick Children, no Canadá, mostraram que a relação é muito mais equilibrada: algo próximo de 1,3 microrganismo para cada célula humana.
A pesquisa, publicada na Plos Biology estima que o corpo de um adulto médio abriga cerca de 30 trilhões de células humanas e 39 trilhões de micróbios. Esse número é tão próximo que “cada evacuação pode inverter essa proporção”, brinca um dos autores do estudo, o biólogo Ron Milo, do Instituto Weizmann, em um artigo da Nature.
Se o número de micróbios surpreende, o impacto deles é ainda mais desconcertante. O conjunto desses organismos – conhecido como microbioma humano – funciona como um órgão invisível, essencial para digerir alimentos, regular o sistema imunológico e até influenciar o humor e o comportamento. “Mesmo quando estamos sozinhos, nunca estamos sozinhos”, escreve Ed Yong, autor do livro Eu Contenho Multidões para o The New York Times. “Quando comemos, eles também comem. Quando morremos, eles nos consomem.”
Cada microbioma é único. Tal como raios ou flocos de neve, não existem dois iguais. E eles estão em constante mudança: idade, hábitos, dieta e medicamentos mudam nosso bioma o tempo todo. Segundo Francisco Guarner, gastroenterologista e membro do comitê científico do Consórcio Internacional do Microbioma Humano, “não conseguimos definir o núcleo essencial das bactérias. Elas não são misturas aleatórias, mas ecossistemas vivos”, disse para o El País.
O microbiologista Ignacio López-Goñi diz em seu livro Microbiota: Os Micróbios do Seu Corpo, que “temos cerca de 23.000 genes humanos, mas, no total, nossos micróbios podem abrigar cerca de 3 milhões de genes. Alguns já consideram esse microbioma como nosso segundo genoma. Somos superorganismos nos quais 1% do nosso genoma é herdado de nossos pais e 99% de nossos micróbios”.
O microbioma funciona como um “órgão paralelo”, responsável por interações químicas e imunológicas que determinam nossa saúde. Distúrbios nesse equilíbrio estão ligados a doenças como diabetes tipo 2, depressão, alergias e Parkinson. A diversidade microbiana, para Guarner, é uma espécie de marcador de saúde: quanto mais variada, mais resiliente é o organismo. Dietas ricas em fibras e vegetais alimentam essa diversidade, enquanto o uso excessivo de antibióticos e alimentos ultraprocessados pode empobrecê-la.
A medicina começa a usar esse conhecimento de maneiras práticas. Transplantes de microbiota fecal, por exemplo, tornaram-se tratamento padrão para infecções resistentes por Clostridium difficile. Pesquisadores estudam agora se micróbios podem determinar a resposta de pacientes a imunoterapias contra o câncer. “Há evidências de que a composição da microbiota pode prever quem responderá melhor ao tratamento”, diz o médico Jordi Guardiola, do Hospital de Bellvitge, em Barcelona, para o jornal espanhol.
Mesmo assim, o campo ainda é um enigma. “Sabemos muito pouco”, diz o endocrinologista José Manuel Fernández-Real, para o El País. “O microbioma é como a caixa-preta de um avião – um registro constante de tudo o que vivemos, comemos, dormimos ou nos estressamos.”
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